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PAPÉIS, PALAVRAS
Rua do Crucifixo, por exemplo.
Conheço as escadas deste prédio
há pelo menos uma década. Eis o alfarrabista
de baixo, o que nunca me reconhece
e todavia se lembra, com razoável pormenor,
de tudo o que lhe vou comprando. O tempo
cultiva nesta sala pudores
por qualquer razão indispensáveis.
Não está certo nem errado. É apenas assim.
Talvez um complexo de lealdade.
As pessoas nascem de uma maneira
e não conseguem fugir dela. Será isso?
Só depois é possível remexer todos os cantos,
procurar no cimo dos armários
os segredos difíceis de aceder:
papéis, palavras, coisas que não ardem.
Vítor Nogueira in Bagagem de Mão (& etc, 2007)
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